sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Átomos que podem curar - artigo de Silas Scalioni

Fonte: Correio Braziliense

Silas Scalioni

Centro de pesquisa ligado à UFMG se prepara para iniciar, pela primeira vez no país, a produção de radiofármacos a partir do carbono 11. Substâncias ajudarão no diagnóstico e no tratamento de doenças como o mal de Alzheimer e alguns tipos de câncer.

Enquanto em alguns lugares do mundo, inclusive no Brasil, comunidades temem a má utilização da energia nuclear, que pode levar a acidentes que afetem suas vidas para sempre, em outro universo, o dos laboratórios científicos, pesquisadores quebram a cabeça para usar o recurso em prol da medicina. Agora, em Minas Gerais, o Centro de Desenvolvimento de Tecnologia Nuclear (CDTN), ligado à universidade federal do estado (UFMG), inicia um trabalho pioneiro no país que busca utilizar o carbono 11 na produção de medicamentos e no desenvolvimento de terapias e diagnósticos de doenças.

De acordo com a química Juliana Batista da Silva, supervisora do Setor de Controle de Qualidade de Radiofármacos do CDTN, o carbono 11 oferece grande vantagem em relação a outros elementos químicos usados na chamada medicina nuclear, que adota substâncias radioativas no tratamento e na detecção de enfermidades. Segundo ela, o carbono, por ser encontrado em substâncias orgânicas, funciona como “um excelente traçador” (substância usada em diagnósticos).

Juliana explica que a produção de radiofármacos (medicamentos elaborados com elementos radioativos) marcados com o carbono 11 depende de um equipamento chamado de Módulo de Síntese para Carbono 11, que o CDTN passará a utilizar este ano. A nova tecnologia faz uma espécie de mapeamento do corpo por meio da tomografia por emissão de pósitrons (PET, na sigla em inglês), gerando uma imagem que identifica a distribuição do radiofármaco no corpo para fins diagnósticos e terapêuticos. “Em alguns países do primeiro mundo, já se usa o carbono 11 na PET, mas, no Brasil, o procedimento que o CDTN começa a desenvolver é pioneiro”, afirma a pesquisadora.

A técnica mais usada no Brasil atualmente é adotada por clínicas nucleares desde 1990 e tem como base o uso da fluordesoxiglicose 18F (FDG). Formada pelo flúor 18 (como elemento radioativo) e a glicose (como composto químico), a FDG é uma das principais fontes de energia celular. Seu uso consiste na injeção de uma pequena quantidade do “açúcar radioativo” no corpo do paciente. Depois de um período de captação, a substância faz com que tumores e problemas cardiológicos e neurológicos possam ser identificados durante a tomografia.

Com a adoção do carbono 11, o programa do CDTN pretende produzir alguns radiofármacos de grande importância para a área médica preventiva, que vão ajudar a combater doenças como o mal de Parkinson e o mal de Alzheimer. Para o diagnóstico de Parkinson, o centro vai produzir o radiofármaco conhecido como 11C-raclopride. Já para detectar a doença de Alzheimer, a solução a ser desenvolvida é o 11C-Pittsburgh Peptide (PIB). “Outros medicamentos vão ser criados simultaneamente, como o 11C-acetato, que vai ser usado para identificar tumores prostáticos mais difíceis de serem diagnosticados”, revela Juliana Batista.

Testes

Para Raquel Gouvêa Santos, bióloga e também pesquisadora do CDTN, a produção do carbono 11 é apenas uma das vitórias alcançadas pela instituição no combate a doenças por meio da adoção da tecnologia nuclear. “Já estamos nos consolidando como centro de excelência no desenvolvimento de radiofármacos”, garante ela, ressaltando que, além do módulo de síntese para carbono 11, o CDTN recebeu, em dezembro, um moderno equipamento PET para pesquisa pré-clínica com pequenos animais. “Como se sabe, todas as experiências científicas são desenvolvidas inicialmente em animais antes de serem aplicadas em pessoas”, explica, destacando que a obtenção do equipamento deve-se à participação da equipe em pesquisas do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Medicina Molecular (INCT-MM).

Para complementar o trabalho, Raquel informa que o INCT–MM, com sede na Faculdade de Medicina da UFMG, receberá ainda este ano um modelo robusto de PET para pesquisas em humanos, que será instalado na unidade da faculdade. “Os médicos do INCT-MM vão unir pesquisa e prática clínica na investigação de anormalidades moleculares e celulares específicas, que acarretam doenças graves e complexas, como o mal de Alzheimer e diversos tipos de câncer. Com esse novo equipamento, bons resultados já aplicados ao homem serão visíveis mais rapidamente”, acrescenta.

Otimistas, as responsáveis pelo setor de pesquisa e desenvolvimento de radiofármacos do CDTN asseguram que está sendo montada na instituição toda a infraestrutura de radiofarmácia usada no desenvolvimento de novos produtos, que, posteriormente, serão estudados no INCT–MM. “No Brasil, não há outro centro de pesquisa em radiofarmácia dedicada ao desenvolvimento de radiofármacos PET inéditos, tanto na fase pré-clínica quanto na clínica, integrados à cadeia produtiva”, assegura Raquel.

Reação nuclear

» O carbono 11, ou C11, é um radionuclídeo obtido a partir de uma reação nuclear entre o nitrogênio 14 e um próton.

» A reação ocorre quando partículas positivas (prótons) são aceleradas em um equipamento conhecido como ciclotron e colidem com o nitrogênio.

» Nessa reação, o nitrogênio perde um nêutron e forma o C11.

Link original: http://www.ipen.br/sitio/?idc=8799

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